Lei que regulamenta nome social remove desconfortos da vida de transgêneros
Por ALECE08/03/2021 11:53
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A maioria das pessoas da sociedade se indentifica como cisgênero, ou seja, tem o gênero identificado com o sexo biológico. Talvez por isso, questões relacionadas aos transgêneros e travestis passem totalmente despercebidas e não sejam sequer entendidas como problemas de toda a coletividade. Mas essa obscuridade não faz as dificuldades enfrentadas por essas pessoas desaparecerem, causando severos malefícios no convívio social.
Uma dessas questões é o nome social. Para quem se identifica com o gênero feminino, ser chamado por um nome masculino, por exemplo, é fonte de constrangimentos, notadamente em ambientes públicos. O uso do nome é muito importante nas relações sociais pois, junto com a aparência, é a primeira coisa que apresenta e identifica as pessoas. Caso haja incompatibilidade entre a imagem corporal representada pelo gênero com o qual a pessoa se identifica e seu nome em seus documentos, a situação gera constrangimento e embaraço às pessoas transgêneros.
O nome escolhido faz parte do processo de transição social junto à alteração de pronomes, aparência e vestuário. Essas modificações estão associadas a uma melhor saúde mental entre os transgêneros. Apesar disso, muitas vezes, os transgêneros não são reconhecidos conforme seu nome social por razões interpessoais ou ainda institucionais. A não utilização de seu nome social pode afetar a saúde mental dessas pessoas em função de discriminação e não inclusão social.
A lei e seus efeitos concretos: trajetórias de mãe e filha marcadas pela defesa do nome social
Para transpor esta dificuldade social imposta aos transgêneros, a Assembleia Legislativa do Ceará aprovou a Lei nº 16.946, publicada no Diário Oficial do Estado no dia 30 de julho de 2019, que assegura o direito ao nome social nos serviços públicos e privados no Estado do Ceará. De acordo com o dispositivo legal, de autoria do deputado Renato Roseno (Psol) e coautoria de Elmano Freitas (PT), fica assegurado às pessoas transexuais e travestis o direito à identificação pelo nome social nos atos e procedimentos promovidos no âmbito da administração pública direta e indireta e no âmbito dos serviços privados de ensino, saúde, previdência social e de relação de consumo.
A jornalista Mara Beatriz, mãe de Lara, transgênero, diz que a nova legislação vem no sentido de ajudar muito a vida das pessoas como a sua filha, que não tinham respeitados os seus nomes sociais. “Lara estudou em uma escola que não respeitava o nome social dela, dentre outras coisas, como no uso do banheiro do gênero com o qual ela se identificava. Quando a gente apresentava algumas normas que já existiam em 2017, assegurando esses direitos, a escola não cumpriu e acabou por expulsar a minha filha. Tivemos de fazer uma grande mobilização, que envolveu Defensoria Pública, acordos judiciais e extrajudiciais”, relata.
Após essa luta em defesa do direito de Lara, Mara Beatriz revela que participa da associação “Mães pela Diversidade”, que existe em todo o Brasil. No Ceará, a entidade está instalada há cerca de três anos. “Entre as mães, celebramos muito a aprovação dessa lei porque ela garante ter no seu documento o nome social, mesmo os filhos menores de idade, que não podem ainda retificar o nome diretamente no cartório”, pontua.
Ela destaca que as pessoas maiores de 18 anos têm autonomia de pedir a retificação de seu nome diretamente no cartório, conforme resolução em âmbito nacional, adotada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). “No registro de nascimento, o nome original é substituído pelo nome social e o gênero é corrigido, conforme a pessoa se identifica. Mas isso tem custo, que a gente tem de desembolsar para o cartório. No caso de a pessoa não ter recursos, ela tem de procurar a Defensoria Pública para entrar com ação judicial e não pagar pela retificação”, explica.
A jornalista acentua que nos casos das pessoas com menos de 18 anos é de extrema utilidade poder ter o RG com o nome civil mais o nome social em destaque. Dessa forma, a pessoa passa a ter um documento comprovando que deve ser chamada por aquele nome. “Foi uma vitória muito grande para a sociedade cearense. Nós precisamos evoluir no nosso pensamento em relação à diversidade. A nossa sociedade é composta das pessoas as mais diversas e o respeito precisa existir”, acentua.
Mara Beatriz avalia que a principal identidade de qualquer ser humano é o seu nome. “É a primeira coisa que a gente recebe ao nascer”, define. “Eu lembro que era muito dolorido eu sair com a minha filha para qualquer espaço público. Na escola, era preciso ficar o tempo todo corrigindo, pois vinha nas provas e no boletim o nome civil. Minha filha chorava, rasurava, porque não se sentia confortável. Em consultas médicas ou nos laboratórios ao fazer exames tinha sempre que pedir por favor para não chamá-la pelo nome civil, até porque ela tem uma aparência muito feminina”, relata Mara Beatriz.
A lei aprovada pela Assembleia Legislativa torna menos desigual o cotidiano de mães como Mara Beatriz e de filhas como Lara.
JS
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