Há 40 anos Tancredo era eleito no Colégio Eleitoral marcando o início da redemocratização no Brasil
Por Júlio Sonsol15/01/2025 08:30 | Atualizado há 3 horas
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Há quatro décadas, a redemocratização do país deu um passo decisivo, com a eleição do mineiro de Tancredo Neves presidente da República pelo colégio eleitoral. De acordo com levantamento realizado pelos pesquisadores do Memorial Deputado Pontes Neto (Malce) Isadora Nepomuceno e Sávio Batista, o colegiado de delegados era formado por senadores, deputados estaduais e federais de cada estado. O Ceará teve 31 delegados. Tancredo Neves foi eleito Presidente da República pelo Colégio Eleitoral, numa terça-feira, 15 de janeiro de 1985, recebendo 480 votos contra 180 dados a Paulo Maluf e 26 abstenções. A votação entre os delegados cearenses marcou o placar de 17 a 14, respectivamente os votos em Tancredo Neves (PMDB) e Paulo Maluf (PDS).
O resultado no nosso Estado favorável à ao candidato do PMDB só foi possível com a participação dos deputados estaduais cearenses. De um total de seis indicados pela Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, todos foram favoráveis a Tancredo Neves. Os deputados estaduais cearenses foram Antônio Gomes (PDS), Etevaldo Nogueira (PDS), Francisco Bezerra (PDS, José Barbosa (PDS), Maria Vieira (PDS) e Raimundo Bezerra (PDS), de acordo com os pesquisadores.
"Tancredo é considerado o primeiro presidente após a ditadura, mas deve se ressaltar que ainda foi uma eleição indireta, com o apoio dos militares e que fazia parte de um processo de anistia que iria deixar todos os crimes cometidos na ditadura para trás de forma diferente ao que ocorreu em outros países onde houve uma ditadura, fator esse que reverbera até hoje", explicam os pesquisadores.
Tancredo Neves, eleito presidente, ao lado da esposa Risoleta e do deputado federal Ulysses Guimarães (PMDB). Foto: Célio Azevedo/Senado Federal
Uma das missões do mandato do novo presidente era fazer uma transição completa da ditadura para a democracia. Essa transição só seria totalmente finalizada quando, em 1988, ocorreu a formação da Assembleia Nacional Constituinte que elaborou a atual Carta Magna. “Com a Constituição de 1988, o Brasil concluiu a transição de ditadura à democracia de agora, amparada por uma nova Constituição, já que enquanto essa não era concretizada, havia um receio de os militares voltarem ao poder”, acentuam os pesquisadores.
Contexto Histórico
Desde o golpe de estado de 1964, o Brasil viveu sob um regime militar que restringia liberdades civis e impunha censura à imprensa, além de reprimir qualquer oposição. Durante o período, o sistema político foi moldado para garantir a perpetuação do poder militar, com eleições indiretas para a presidência da República. O auge da repressão aconteceu durante os anos 1968 a 1974, com o AI-5 e o governo do general Médici, mas a partir de 1979, com o governo de João Figueiredo, o regime começou a dar sinais de esgotamento.
As pressões internas e externas por abertura política foram crescendo no final dos anos 1970. O movimento sindical ganhava força, e a sociedade civil começou a se organizar em torno de campanhas como a Anistia Política em 1979 e o movimento das Diretas Já, que, em 1984, mobilizou milhões de brasileiros em prol do restabelecimento das eleições diretas para presidente.
No entanto, apesar do clamor popular, a emenda Dante de Oliveira, que propunha a volta das eleições diretas, foi rejeitada no Congresso em abril de 1984. Com isso, a eleição do presidente da República para o mandato de 1985-1990 ainda seria indireta, conduzida pelo Colégio Eleitoral, composto por deputados, senadores e representantes das assembleias legislativas estaduais.
Estratégia
Diante da impossibilidade de eleições diretas, a oposição articulou uma estratégia para derrotar o candidato governista no Colégio Eleitoral. Assim nasceu a Aliança Democrática, uma coalizão entre o PMDB, liderado por Ulysses Guimarães, e o dissidente do regime militar José Sarney, que à época integrava o PDS, partido que dava sustentação ao governo de então.
O nome de Tancredo Neves surgiu como o candidato ideal para essa aliança. Com uma trajetória política longa e respeitada, Tancredo era visto como um conciliador, capaz de transitar tanto entre as elites políticas quanto entre os setores populares. Sua experiência como primeiro-ministro no breve período parlamentarista entre 1961 e 1962, sua atuação durante o governo de Getúlio Vargas e sua postura equilibrada ao longo do regime militar reforçavam sua imagem de estadista.
A chapa oposicionista foi formada com Tancredo Neves como candidato à presidente e José Sarney como candidato a vice-presidente. Essa escolha foi estratégica, pois Sarney trazia consigo apoio de setores do regime militar que estavam dispostos a apoiar uma transição negociada.
Colégio eleitoral
Delegados do Colégio Eleitoral deram vitória expressiva para a chapa Tancredo/Sarney. Foto: Célio Azevedo/Senado Federal
O Colégio Eleitoral de 1985 era composto por 686 membros, sendo a maioria pertencente ao PDS, partido do governo. Inicialmente, o candidato governista seria Mário Andreazza, mas a escolha gerou divisões dentro do partido. O então presidente João Figueiredo se recusou a apoiar oficialmente qualquer candidato, o que enfraqueceu ainda mais a base governista.
O PDS acabou lançando como candidato Paulo Maluf, figura que enfrentou resistência de setores da sociedade. O ex-governador de São Paulo representava a continuidade do regime militar, enquanto Tancredo encarnava a esperança de mudança. Essa polarização foi decisiva para que muitos parlamentares do PDS, insatisfeitos com Maluf, votassem em Tancredo.
A campanha no Colégio Eleitoral foi marcada por intensas negociações políticas, em que promessas de cargos e ministérios fizeram parte do jogo político. Apesar disso, a vitória de Tancredo foi expressiva: ele obteve 480 votos, contra 180 de Paulo Maluf.
Impactos
A eleição de Tancredo Neves foi um marco da transição democrática. Embora não tenha sido uma eleição direta, ela representou uma ruptura com o regime militar e a construção de um novo pacto político, que abriu caminho para a Constituição de 1988 e a consolidação da democracia brasileira.
O discurso de Tancredo no Colégio Eleitoral enfatizou a necessidade de reconciliação nacional e prometeu a construção de um país mais justo e democrático. Seu projeto incluía a convocação de uma Assembleia Constituinte, a restauração dos direitos civis e políticos, e a promoção de reformas sociais e econômicas.
Restauração
O coordenador do Malce, Paulo Roberto Nunes, explica que a eleição de Tancredo Neves por meio de colégio eleitoral fez parte de um próximo de restauração da democracia brasileira que ocorreu de uma forma monitorada, gradual e lenta que trouxe a concretização da Constituição de 1988.
"Isso nos trazia sempre uma preocupação sobre se de fato nós conseguiríamos, sociedade brasileira e seus representantes, chegar a bom termo porque a percepção que nós tínhamos era de que estávamos sempre constantemente sendo monitorados e tutorados, de uma forma inadequada, ou, pelo menos, que ia de encontro aos próprios princípios democráticos que nos moviam", salienta.
Ele considera também que uma das consequências deste processo vigiado é que os responsáveis pelos anos de ditadura não foram de fato investigados, julgados e ou eventualmente punidos. "Especialmente aqueles que praticaram crimes de tortura e morte", observa. O aspecto positivo, segundo Paulo Roberto Nunes, foi o país ter conseguido construir uma democracia com base em instituições que têm se tornado cada vez mais sólidas.
"Nós somos uma nação em constante aprendizado, com pouco mais de 200 anos de existência. Um país que tem suas origens a partir da colonização de Portugal há 524 anos e que tem construído a partir de 1985 a redemocratização com a própria eleição de Tancredo Neves", completou.
Reviravolta
A trajetória de Tancredo Neves foi marcada por uma reviravolta trágica. Em 14 de março de 1985, na véspera de sua posse, Tancredo foi internado com uma grave infecção abdominal. Seu estado de saúde se agravou, e ele morreu em 21 de abril de 1985, sem ter assumido a Presidência.
A morte de Tancredo gerou comoção nacional. Milhões de brasileiros foram às ruas para prestar homenagens ao presidente que simbolizava a esperança de um novo tempo. Sua morte abriu um vazio político que foi ocupado por José Sarney, o vice-presidente, que acabou assumindo o cargo.
Edição: Paulo Veras
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