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Pai é quem cria?: Quem é o padrasto, afinal?

Por Fátima Abreu e Salomão de Castro
18/08/2023 07:27 | Atualizado há 1 ano

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Última matéria da série mostra o cotidiano de padrastos Última matéria da série mostra o cotidiano de padrastos - Arte: Publicidade/Alece

O Portal do Servidor conclui, nesta sexta-feira (18/08), a série especial "Pai é quem cria?", relativa às famílias em que a figura do padrasto tem papel central. Para tratar da realidade de famílias diferenciadas, no mês em que transcorre o Dia dos Pais (13/08), acompanhamos as trajetórias de Antonio Mendes Lima e Gustavo de Castro e Silva Teixeira, que vivem essa realidade juntos aos enteados. A matéria trata ainda de outros aspectos destes relacionamentos.

 “Amar é aquilo que embasa,

  é ter comprometimento.

Amar é voar sem asa,

e porque amar é acolhimento,

amar é mudar a alma de casa.”

(Mário Quintana)

A maneira como se trata uma pessoa pode provocar aproximação ou afastamento. Isso se acentua nos casos de crianças e adolescentes diante da figura do “novo pai”. Em muitos lares, eles são constrangidos a lidar com situações que estão fora do seu alcance, ou seja, o divórcio e o recasamento dos pais. Partindo do princípio de que a separação dos pais biológicos sequer foi superada, a convivência com uma pessoa estranha ao seu ambiente necessita de tempo e de muita atenção. A situação pode até se harmonizar ao longo da convivência, mas há que se admitir que o conflito, por menor que seja, está presente.

Contudo, levando em consideração o que expressa o poeta, tradutor e jornalista gaúcho Mário Quintana, “amar é mudar a alma de casa”, a rotina modifica a forma de ver e de tratar mais amigavelmente o novo personagem que se apresenta, nem sempre para “assombrar” o imaginário e a resistências à mudanças da criança e do adolescente.

Nesta realidade, surgem questões incômodas: Quem é o atual marido da mãe? Como chamá-lo? Há muitas formas de se dirigir ao padrasto (amigo, tio, "ele", o cara, dentre outros) e, dependendo da idade, a criança/adolescente pode tratá-lo de pai, mas, para isso se faz necessário consenso das partes envolvidas. 

Tio, o tratamento usual

Trazendo a realidade mais próxima de nós, o Portal do Servidor ouviu Antonio Mendes Lima, 43 anos, colaborador da Alece, casado há 19 anos, e que se tornou padrasto bem jovem. Ele conta que foi uma experiência marcante em sua vida, considerando que entrava numa relação com uma mulher, mãe de duas crianças: Cassiano, com 11 anos, e Isabele, com quase cinco anos. "Hoje já são adultos e estão cuidando da vida", informa.

Ele lembra que desde o início, o relacionamento foi muito bom. "Os meninos queriam me chamar de pai, mas como eu sempre via o pai verdadeiro, achei melhor que eles me tratassem como tio, e assim ficou: Titonho", recorda.

Antonio Mendes Lima: apoio aos enteados da infância à vida adulta - Foto: Paulo Rocha

O rapaz de sorriso fácil diz que sempre teve uma boa relação com os meninos, de muito respeito, estando atento à alimentação e à saúde deles - a ponto de ter conseguido emprego para um dos enteados. Antonio Mendes Lima, conhecido pela maioria como Toinho, declara que não quis ter filhos. "Por insegurança mesmo, porque caso o casamento não desse certo, não gostaria de ter que deixar de conviver plenamente com um filho meu", justifica. O tempo passou e o receio se fez presente. “Mas sempre me senti pai deles. Chegaram até a chamar minha mãe de avó", revela.

Há 23 anos ele cumpre a função de jardineiro na Assembleia Legislativa, contratado pela empresa Certa. "Jardim é aquela coisa bonita, que a gente sempre cuida e ver a planta crescendo dá uma grande satisfação", afirma. Antonio Mendes é visto pelos companheiros de trabalho como pessoa dedicada e muitos comentam que o resultado da sua faina é de um ambiente colorido e viçoso. "O lado que ele trabalha fica sempre mais bonito, mesmo usando os mesmos recursos que a gente usa", ressaltam os colegas de trabalho.

Pai e "tio"

"Um velho cruza a soleira
De botas longas, de barbas longas
De ouro o brilho do seu colar
Na laje fria onde coarava
Sua camisa e seu alforje de caçador

O meu velho e invisível
Avôhai

Avô e Pai"

"Avôhai"/ Zé Ramalho

Avô e pai, como na canção de Zé Ramalho? Nem tanto. Mas tio e pai, aí sim. O mesmo tratamento (tio/tia) é dado a Gustavo de Castro e Silva Teixeira, 37 anos, administrador de empresas, e à jornalista Aline Pedrosa, assessora de imprensa da deputada estadual Larissa Gaspar (PT). Casados desde 2022, eles têm filhos de relacionamentos anteriores: Gustavo é pai de duas meninas (Clarice, de dez anos, e Cecília, de seis), e Aline, mãe dos gêmeos Cauã e Gaya (oito anos).

Segundo o administrador de empresas, a convivência com as crianças é maravilhosa. “Não usamos os termos padrasto/madrasta e quando alguém pergunta se são meus filhos, digo que sim porque temos os nossos filhos biológicos e os de coração e fazemos isso para que eles se sintam seguros”, assegura.

Gustavo de Castro e Silva: a experiência única de ser simultaneamente pai e “tio” - Foto: Acervo pessoal

Para Gustavo, a prioridade é manter o clima de harmonia em casa. "Da mesma forma que procuro construir esse laço forte, a Aline também procura fazer o mesmo com minhas filhas", acentua.

Durante a rotina familiar, o casal costuma reunir os filhos com a intenção de torná-los próximos. “Aline tem um pouco de diferença de dinâmica porque durante a semana os filhos dela passam um dia conosco e, noutro, com o pai biológico e os avós paternos. A comunicação é muito boa, e no final de semana é alternado. A gente concilia para que as crianças fiquem sempre juntas”, reforça ele, destacando como importante a constituição familiar. 

O pai que se pede

São muitos os exemplos de lares felizes envolvendo crianças/adolescentes e padrastos. Em muitos casos, a manifestação de proximidade parte dos enteados, como é caso do garoto Angelo, de oito anos, que, em junho de 2021, obteve da Justiça do Ceará o direito de ter no seu registro de nascimento o sobrenome do padrasto Adilson.

A solicitação foi atendida pela juíza de Direito, Kathleen Nicola Kilian, que na ocasião estava à frente da 1ª Vara de Quixeramobim. Por meio de uma carta endereçada a ela, Angelo argumentou que o padrasto "foi quem esteve comigo nos momentos bons e ruins". O fato ganhou repercussão nacional, fazendo com que o exemplo do pequeno cearense despertasse a sociedade para a necessidade de um olhar mais atencioso ao desenvolvimento e bem estar da criança e do adolescente.

A magistrada, hoje juíza de Direito Titular da Vara Única da Infância e Juventude de Sobral, atendeu a solicitação do menino, respaldada pela Lei Nº 11.294/09, que permite ao padrasto dar o seu nome ao enteado(a), de autoria do então deputado federal Clodovil Hernandes (à época do PR de São Paulo), em 2009.

Natali Massilon Pontes, defensora pública, trata do reconhecimento da paternidade afetiva - Foto: Acervo pessoal

A defensora pública Natali Massilon Pontes, que atuava no Núcleo de Atendimento e Petição Inicial da Defensoria Pública na Alece, considera a história de Angelo, como um caso clássico do reconhecimento da paternidade afetiva.

Segundo ela, isso ocorre, “quando uma pessoa que não tem vínculo biológico com a criança e exerce a função de pai/mãe ela pode ter esse reconhecimento da afetividade no registro da criança. E, a partir daí, a criança passa a ser considerada filha, assim como essa pessoa passa ser considerado pai/mãe com todos os direitos inerentes à paternidade” confirma.

Um caso emblemático 

A respeito do tema, nos defrontamos com exemplos significativos e de conhecimento público, como é o caso do empresário Mico Freitas com Suzanna, filha de Kelly Key e Latino. A menina tinha menos de dois anos de idade quando a cantora começou a namorá-lo e, com o passar do tempo, tornou-se filha socioafetiva. Antes disso, já havia adotado o sobrenome do marido da mãe.

Sobre a relação com a jovem, Mico Freitas declarou à imprensa nacional à época: "No início, eu era o Mico, amigo da mamãe, depois o Mico, namorado da mamãe, depois chegou o ‘Pai Mico’ e por último o ‘PAI’! Todo esse processo foi relativamente rápido, mas nunca forçado. O que sempre quis foi que você se sentisse amada e que teria alguém sempre do seu lado!" declarou o empresário.

Sobre a série

Nesta segunda e última parte da reportagem especial “Pai é quem cria?”, apresentamos casos que representam o desejo da grande maioria que vivencia essa realidade. Apesar dos inúmeros desencontros entre homens e mulheres, que findam e recomeçam relacionamentos, o importante é reconhecer na família a instituição mais real como suporte de garantias para o crescimento saudável de crianças e adolescentes.

A série especial "Pai é quem cria?" tem produção de Fátima Abreu, Salomão de Castro e Virgínia Bastos, textos de Fátima Abreu e Salomão de Castro, com edição de Salomão de Castro.

Confira a primeira matéria da série no link https://tinyurl.com/w82bv3cx 

Edição: Salomão de Castro

 

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