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Ex-deputado estadual e ex-senadores avaliam 30 anos do Impeachment de Collor

Por Júlio Sonsol, Paulo Veras e Salomão de Castro
30/12/2022 09:20 | Atualizado há 1 ano

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Ex-senadores e ex-deputado estadual relembram fatos que marcaram o Impeachment de Collor Ex-senadores e ex-deputado estadual relembram fatos que marcaram o Impeachment de Collor - Arte: Publicidade/Alece

O Portal do Servidor encerra, nesta sexta-feira (30/12), a série especial que reconstitui o processo de Impeachment do então presidente da República, Fernando Collor de Mello, em 1992. O ex-deputado estadual Mário Mamede e os ex-senadores Cid Carvalho e Mauro Benevides dão depoimentos sobre a mobilização do Ceará e do Brasil no segundo semestre daquele ano, encerrada com a decisão do Senado Federal pelo Impeachment, no dia 30 de dezembro de 1992, ensejando a posse de Itamar Franco na Presidência da República

Nesta sexta-feira (30/12), transcorrem precisamente três décadas que o Senado Federal aprovou, por 76 votos a três, o Impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello. O dia 30 de dezembro de 1992 marcou o fim de um período iniciado em 1989, com a vitória surpreendente de Collor em uma disputa com nomes expressivos da política nacional, como Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Leonel Brizola (PDT), Mário Covas (PSDB) e Ulysses Guimarães (PMDB), dentre outros.

Personagens relevantes naquele período histórico, o então deputado estadual Mário Mamede (PT) e os à época senadores Cid Carvalho e Mauro Benevides (ambos do PMDB na ocasião) avaliam o cenário político da Era Collor, 30 anos depois do encerramento do período.

Em 1992, o médico Mário Mamede estava no exercício do primeiro mandato de deputado estadual, sendo o único representante do Partido dos Trabalhadores (PT) na Assembleia Legislativa do Ceará. Segundo ele, as forças democráticas do País, notadamente as identificadas com a esquerda, apoiadoras da candidatura de Lula à Presidência em 1989 e o movimento sindical tinham a expectativa de que o então presidenciável pelo PT pudesse vencer Collor na primeira eleição após a Redemocratização de 1985.

"Talvez tenha sido a campanha mais emocionante e entusiasmada de Lula, considerando as características de cada uma. Foi um momento heroico e a gente tinha consciência disso", recorda. Para ele, a vitória do petista foi frustrada pelas forças contrárias, que buscavam desqualificar Lula. Mamede lembra que a carga de preconceito contra a candidatura da Frente Brasil Popular (PT-PSB-PCdoB) encontrou ressonância em grande parte da mídia.

Para Mário Mamede, a manipulação política dos eventos, notadamente por parte da Rede Globo, emissora de maior audiência, tinha o objetivo de viabilizar Collor eleitoralmente transformando o ex-governador de Alagoas, sem nenhuma projeção no cenário nacional, em favorito ao pleito, pelo qual concorreu por uma sigla considerada inexpressiva à época por Mamede - o Partido da Reconstrução Nacional (PRN). "Ele chegou a ser apelidado de caçador de marajás pela mídia, quando na verdade, na época em que governou seu estado, criou os marajás do serviço público. Estes nunca foram caçados nem tiveram os salários reduzidos", afirma.

Para Mário Mamede, Collor teve todo o apoio das classes mais favorecidas, propiciando uma disputa política desigual, vindo a ser vitorioso sobre Lula no segundo turno da eleição de 1989. Após a eleição de Collor, o petista disse perceber o surgimento de situações "esquisitas", com denúncias referentes a relações de compadrio entre o presidente recém-eleito e os então deputados federais Renan Calheiros (PRN-AL) e Roberto Jefferson (PTB-RJ), resultando posteriormente no surgimento de denúncias de utilização irregular de recursos públicos decorrentes de Caixa 2 (valores não contabilizados oficialmente na campanha de 1989), o que envolvia o tesoureiro da campanha de Collor, o empresário Paulo César Farias.

"Depois de episódios referentes à Casa da Dinda (reforma na residência oficial do Presidente da República), houve a denúncia que envolveu o motorista Eriberto França, a doação do Fiat Elba, que nunca foi esclarecida, e outras que foram se somando. Também contribuiu para a imagem altamente negativa do presidente a figura do empresário PC Farias, de extrema confiança de Collor, que chegou a fazer comemorações quando o volume de propinas arrecadadas chegou a um determinado montante. Havia também um beneficiamento exagerado e indevido a outros setores vinculados à Presidência", elenca Mamede, que, no Plenário 13 de Maio, reverberou as denúncias em 1992, ao lado dos deputados Inácio Arruda (PCdoB) e Eudoro Santana (PSB).

Conforme Mário Mamede, por ter concorrido amparado em uma sigla sem relevância, o PRN, dentro do Congresso Nacional, a base de apoio parlamentar de Collor no Congresso Nacional não o permitiu enfrentar e resistir à situação que se apresentou. "O fato é que quando o volume de denúncias chegou à Câmara dos Deputados e ao Senado, o julgamento de natureza política foi totalmente desfavorável a Collor de Mello. O veredito foi que ele não tinha condição de continuar na Presidência", acentua.

Votação no Senado encerrou ciclo e deu início ao governo Itamar

No segundo semestre de 1992, diante de denúncias de irregularidades cujas cifras chegavam a 60 milhões de dólares arrecadados ilicitamente, tudo em troca de favores políticos e propina com objetivos políticos, o clima político no Congresso Nacional se tornou hostil ao então presidente. A oposição, liderada por três grandes partidos (PT, PSDB e PMDB) atuou em bloco e conseguiu convocar uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar o “Esquema PC” e buscar possíveis relações com Fernando Collor. A mobilização era liderada pelos presidentes dos três grandes partidos: Lula (PT), Tasso Jereissati (PSDB) e Orestes Quércia (PMDB). Com o aprofundamento das investigações, membros da CPMI passaram a defender o Impeachment.

Collor contra-atacou buscando conseguir o apoio de 1/3 do Congresso, sem sucesso. O presidente convocou o povo para ir às ruas para apoiá-lo, confiante na popularidade que tinha sido demonstrada nas urnas. Todavia, a estratégia não surtiu efeito e a população realmente foi às ruas, mas para, em sua maioria, se posicionar a favor do Impeachment. A maior expressão das manifestações populares se dava por meio dos estudantes de ensino médio, denominados de "caras-pintadas" pela imprensa na ocasião.

Naquele momento, o Ceará era representado no Senado Federal por Cid Carvalho (PMDB), Mauro Benevides (PMDB) e Beni Veras (PSDB). Os três tomaram posição a favor do processo de impedimento do presidente da República.

Cid Carvalho assegura ter sido um dos primeiros senadores a abordar as denúncias contra Collor na tribuna do Poder Legislativo. “Fui a primeira voz sobre o assunto no Senado Federal, muito antes da Câmara dos Deputados começar o processo de Impeachment. Depois que falei da necessidade de se aplicar o Impeachment ao então presidente Fernando Collor de Melo no plenário do Senado, o assunto começou a ser discutido de forma frontal”, relembra Cid.

Para o ex-senador, não havia como evitar o afastamento de Collor, pois o comportamento do presidente não era de um democrata. "Ele perdeu a noção de País, de República, de Pátria. Queria governar a seu modo e se tornou arbitrário”, afirma. Cid lembra que quando Collor renunciou ao mandato, enquanto transcorria a sessão do Senado Federal para evitar a instauração do processo, em 29 de dezembro de 1992, os parlamentares ficaram surpresos e houve momentos de impasse sobre como o processo seguiria. “Quando o advogado dele leu a carta-renúncia, quase não acreditei, porque seu estágio mental era de um ditador e não o de um presidente da República”, acentua.

Mesmo tendo sido a favor do afastamento, Cid tinha uma posição diferente da maioria após a renúncia de Collor. “Tive dúvidas em relação à aplicação das penas complementares. Inicialmente, minha avaliação era a de que no momento da renúncia, automaticamente Collor deixou de ser o presidente da República e aquelas penalidades anexas eram demasiadas”, reflete o ex-senador, que é advogado e jornalista. No entanto, Cid conta que as conversas mantidas com o então senador José Sarney (PMDB-AP) e com outros senadores o levaram a votar acompanhando a maioria do Senado, pela aplicação das penalidades conexas.

Cid Carvalho enxerga um fato positivo com o impedimento de Fernando Collor, com a chegada do então vice-presidente Itamar Franco à Presidência da República. “Itamar fez um trabalho tão bom que virou unanimidade nacional”, conta Cid, em referência ao sucessor de Collor. O ex-senador entende que Itamar Franco ficou marcado como o presidente que estabilizou a economia do País.

Cid conta que a popularidade de Itamar era tão grande que chegou a se reunir com ele em Fortaleza, no apartamento do então deputado federal Paes de Andrade (PMDB-CE), na Praia de Iracema, para discutir uma possível candidatura à reeleição do então presidente (a reeleição, no entanto, foi instituída no Brasil somente a partir das eleições de 1998, quando o mandato de Itamar na Presidência havia sido concluído). “Conversamos durante quase uma noite inteira sobre a possibilidade de sua candidatura à reeleição. Mas nada deu certo. A carreira de Itamar, após cumprir o mandato que era de Fernando Collor, ficou restrita a Minas Gerais, seu estado natal, onde teve bastante sucesso eleitoral”, complementa. Após deixar a Presidência, Itamar foi eleito governador de Minas Gerais, pelo PMDB, em 1998, e senador, pelo PPS, em 2010.

Cid Carvalho faz questão de frisar que todo o processo do Impeachment de Collor ocorreu de forma pacífica e respeitando as leis do país. Ele acrescenta que os senadores agiram com equilíbrio, não havendo qualquer tipo de exagero nas punições aplicadas.

Presidente do Senado em 1992 aponta clamor popular como elemento decisivo

Mauro Benevides, que presidiu o Senado nas sessões de 29 e 30 de dezembro de 1992 que resultaram no Impeachment, lembra que a ampla divulgação dos fatos pela mídia fez com que houvesse um clamor popular, o que exigiu dos congressistas uma atitude diante das denúncias e acusações que pesavam contra Collor. "Os fatos que vieram à tona foram fundamentais para a abertura do processo contra o então presidente", afirma.

Trinta anos depois do Impeachment de Collor, o ex-senador lembra que não foi fácil comandar o Congresso Nacional naqueles dias. “Quem tem a responsabilidade de dirigir os destinos da Casa que comanda o processo legislativo do País não pode fugir da missão, sobretudo num processo de julgamento de tamanha importância para o Brasil”, entende.

Dentre os senadores do Ceará em 1992, Beni Veras faleceu em 2015.

Passadas três décadas, o Impeachment de Fernando Collor é ainda um episódio marcante para a política nacional. No vídeo abaixo da matéria, o ex-senador Cid Carvalho recorda o processo de Impeachment de Collor no Senado Federal.

A série especial sobre os 30 anos do Impeachment de Fernando Collor de Mello tem produção de Salomão de Castro e Júlio Sonsol, textos de Júlio Sonsol, Salomão de Castro e Paulo Veras, edição de Salomão de Castro e Paulo Veras.

Confira as matérias anteriores da série nos links https://tinyurl.com/5bn447jc e https://tinyurl.com/3knhnt8d 

Edição: Salomão de Castro

 

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