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Alece e Sintaf se unem pela preservação do legado de Bárbara de Alencar

Por Salomão de Castro e Paulo Veras
11/04/2024 09:52 | Atualizado há 1 mês

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Na primeira matéria, conheça a trajetória de Bárbara de Alencar Na primeira matéria, conheça a trajetória de Bárbara de Alencar - Arte: Publicidade/Alece

O Portal do Servidor inicia, nesta quinta-feira (11/04), a série especial “O resgate da heroína Bárbara”. Desde 2023, a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) e a Fundação Sintaf, do Sindicato dos Fazendários do Ceará, estão unidas na realização de ações concretas pela preservação da memória e do legado histórico de Bárbara de Alencar, em Fortaleza e nos municípios da região do Cariri, no interior do Estado. Na primeira matéria, conheça a trajetória da homenageada. O coordenador regional do Sintaf no Cariri, Luiz Carlos Diógenes, e a diretora da Estação de Cultura do Instituto Bárbara de Alencar, Magnólia Arrais, avaliam a relevância da mulher Bárbara para a História do Ceará.

“Hoje ao passar pelos lados

Das brancas paredes,

paredes do forte

Escuto ganidos, ganidos, ganidos, ganidos

Ganidos de morte

Vindos daquela janela

É Bárbara, tenho certeza

É Bárbara, sei que é ela

Que de dentro da fortaleza

Por seus filhos e irmãos

Joga gemidos, gemidos no ar

Que sonhos tão loucos, tão loucos, tão loucos

Tão loucos foi Bárbara sonhar”

“Passeio Público”, música de Ednardo (1976)

Bárbara Pereira de Alencar veio ao mundo em Exu (PE), em 11 de fevereiro de 1760. Nascida em uma época em que o papel social feminino era restrito à execução das ordens do patriarcado, Bárbara exercitou uma ousadia que seria a semente a gerar as raízes do protagonismo feminino no Ceará, no Nordeste e em todo o Brasil.

De origem abastada, fruto das posses do patriarca da família Alencar, seu avô Leonel Alencar Rêgo, desde cedo Bárbara demonstrou sua forte personalidade, que ia de encontro às tradições culturais dominantes do século XVIII, quando as mulheres eram relegadas a um papel secundário e de quase nenhum poder de decisão.

Veio para o Ceará ainda jovem, para a região do Cariri, mas especificamente para a então Vila do Crato. Casou-se, por escolha própria, com o comerciante português José Gonçalves dos Santos, com quem teve cinco filhos: João Carlos José dos Santos, João Gonçalves de Alencar, Joaquina Maria de São José, Tristão Gonçalves Pereira de Alencar e José Martiniano de Alencar. Este último é pai do romancista José de Alencar.

Trajetória familiar 

“Fim de jugo, fim do jogo
Manda juntar o povo
Bárbara mandou chamar
Bárbara de Alencar

Não pode mais esperar
Tem que raiar a liberdade
E quando uma mulher vem à cidade
Nada pode segurar”

“Bárbara de Alencar”, música de Zélia Duncan e Ana Costa (2023)

O coordenador regional do Sindicato dos Fazendários do Ceará (Sintaf) no Cariri, Luiz Carlos Diógenes, atesta a origem do poderio econômico da família. “Bárbara realmente teve uma origem de família poderosa. Os avós vieram de Salvador (BA) e se estabeleceram na região de Exu. Por lá se estabeleceram e criaram fortuna, com seus domínios se estendendo para o lado do Crato”, recorda. Segundo Luiz, o pai de Bárbara, Joaquim Pereira de Alencar, herdou os bens e deu seguimento a influência da família.

A condição financeira e de poder da família ofereceram para Bárbara de Alencar uma oportunidade quase nunca dada para as mulheres da época: o estudo. Esta realidade iria acabar por incentivar Bárbara a uma participação efetiva em conversas e discussões variadas sobre temas de peso na época, forjando sua liderança na região e possibilitando amizades influentes, como a de Manoel Arruda de Câmara, que a iniciou nas ideias liberais de nomes como Voltaire (François-Marie Arouet, conhecido por Voltaire, filósofo iluminista francês - 1694/1778), Montesquieu (Charles-Louis de Secondat, filósofo francês a quem chamavam Montesquieu - 1689/1755) e Rousseau (Jean-Jacques Rousseau, filósofo suíço - 1712/1778). Em 1810, Manoel Arruda daria a ela o título de heroína, por suas fortes posições contrárias à Monarquia.

Luiz Carlos Diógenes, coordenador regional do Sintaf no Cariri - Foto: Divulgação/Assessoria de Imprensa do Sintaf

Luiz Carlos salienta que o ideário da época, quando eclodiram revoluções nos Estados Unidos e na França, influenciou fortemente a construção do liberalismo no Brasil. “Manoel de Arruda Câmara, frei carmelita, retornou da Europa com um diploma de botânico em uma mão e na outra as ideias libertárias da revolução francesa. Ele se tornaria o mentor de Bárbara nas ideias do liberalismo”, acentua.

Bárbara e o movimento de 1817

Desde a vinda da corte portuguesa para o Brasil, fugindo das tropas de Napoleão Bonaparte, os impostos e taxas cresceram de forma a bancar a realeza. Isso aumentou o desagrado de lideranças nordestinas, já inconformadas com a transferência da capital para o Rio de Janeiro. O contexto sócio-econômico levou à eclosão de ideias separatistas.

No Cariri cearense não foi diferente. Influenciada pelas ideias disseminadas no seminário de Olinda (PE), onde estudava José Martiniano, um dos filhos, Bárbara passou a apoiar a revolução republicana de 1817 no Crato.No dia 3 de maio daquele ano, após a tradicional missa na igreja matriz, o seminarista tomou a palavra e conclamou a todos contra a coroa portuguesa. Foi aplaudido e uma bandeira branca hasteada como símbolo da nova república. A mãe, mesmo sem estar presente na igreja, avalizou tudo com seu prestígio.

O sonho, no entanto, durou somente oito dias. Forças armadas da monarquia debelaram a insurreição, prendendo seus principais líderes, inclusive Bárbara de Alencar. Os presos foram levados para Fortaleza, enfrentando um calvário proposital, que tinha por objetivo mostrar a todos no sertão o que acontecia com quem ousava desafiar o rei. Em seguida, os pesos foram mandados para a Bahia. Bárbara teve todos os bens confiscados e leiloados pela Coroa.

Do conforto à luta coletiva: o papel de Bárbara na Confederação do Equador

“Quem bebe da minha caneca tem sede de liberdade”.

Frei Caneca (1779-1825), religioso e revolucionário brasileiro. Apoiou a Revolução Pernambucana de 1817 e a Confederação do Equador em 1824, movimentos pela independência do Brasil.

A diretora da Estação de Cultura do Instituto Bárbara de Alencar, Magnólia Arrais, destaca a coragem de Bárbara. “Ela saiu de sua vida confortável para lutar pelo que acreditava de forma persistente e decidida, arriscando sua vida, família e patrimônio em prol da luta pela República”, atesta.

Para Magnólia, Bárbara foi uma mulher pioneira, avançada no momento histórico em que viveu, tendo dedicado sua vida aos ideais de liberdade e teve um papel muito importante ao colocar a mulher em uma posição de destaque. “Em um momento em que as mulheres não tinham direito de ter opinião sequer na própria casa, ela protagonizou a organização de movimentos políticos revolucionários, quebrando todos os paradigmas”, pontua.

Magnólia Arrais, diretora da Estação de Cultura do Instituto Bárbara de Alencar - Foto: Acervo pessoal

Bárbara ganhou a liberdade no final de 1820, assim como seus dois filhos mais velhos, Tristão e Carlos. Os anos encarcerados não diminuíram o desejo de liberdade, que voltaria a se manifestar efusivamente em 1824. O movimento revolucionário conhecido como Confederação do Equador chega aos 200 anos em 2024.

Naquele ano, D. Pedro I, então imperador do Brasil, dissolveu a Constituinte, de forma a resguardar as regalias portuguesas em nosso País. Estourava a Confederação do Equador, de cunho separatista e republicano, rapidamente abraçada pelos Alencar no Ceará, com engajamento de Bárbara e dos filhos, sendo Tristão Gonçalves nomeado governador do Ceará. Mas esta revolução também não teve maior duração, culminando, inclusive, com a morte de Tristão e de outros revolucionários como Padre Mororó, Feliciano Carapinima e Azevedo Bolão, todos condenados ao fuzilamento e eternizados como nomes de logradouros de Fortaleza (avenida Carapinima, no Benfica, e ruas Padre Mororó, no Centro, e Azevedo Bolão, na Parquelândia).

Após estes acontecimentos, Bárbara de Alencar recolheu-se. Já quando idosa, viveu seus últimos dias de maneira resguardada, embora sem deixar de lado o espírito e convicções que regeram sua vida.

Ao tratar de Bárbara de Alencar, Luiz Carlos Diógenes aponta a dualidade na personalidade da heroína que, embora fosse conservadora no aspecto religioso, tratava-se de uma figura multifacetada e revolucionária em vários segmentos, tendo influenciado a política, a cultura e os costumes. “Foi a primeira republicana do país”, assevera.

O legado de Bárbara foi deixado na cultura e empreendedorismo, “tendo a luta política como pano de fundo em todas as questões”, ressalta o sindicalista. “Sua grande força é ter vivido por uma causa política. A emancipação não dispensa em nenhuma hipótese a luta política”, compreende.

Magnólia Arrais, em visita de estudantes ao Instituto Bárbara de Alencar - Foto: Acervo pessoal

Entretanto, mesmo com seu pioneiro papel, Bárbara de Alencar não descuidou de facetas imputadas a uma matriarca como ela, realidade inevitável naquele momento histórico para as mulheres. Ela criou os filhos, cuidou de seu pai e administrou as terras e negócios da família. Magnólia Arrais salienta que Bárbara saiu de sua vida confortável para lutar pelo que acreditava de forma persistente e decidida. “Sua figura histórica determinante deve ser encarada, rememorada e divulgada como heroína que realmente ela foi”, defende.

Resgate histórico

Em 2022, foram registrados os 190 anos da morte de Bárbara de Alencar. Já em 2024, transcorre o bicentenário da Confederação do Equador, um dos movimentos separatistas e republicanos nos quais a heroína teve participação.

Por isso, o Sindicato dos Fazendários do Ceará, por meio da Fundação Sintaf, e a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) realizam, desde 2022, ações que visam resgatar a memória da heroína Bárbara de Alencar e o conjunto de valores que ela representa, dando destaque ao protagonismo das mulheres na transformação da sociedade. 

Essas ações serão tratadas na segunda matéria desta reportagem especial, que objetiva dar suporte para o reconhecimento da figura de Bárbara de Alencar e sua importância para as novas gerações.

Fontes: Livros “Bárbara de Alencar”, de Ariadne Araújo (Edições Demócrito Rocha), e "Bárbara de Alencar, a Guerreira do Brasil", de Roberto Gaspar (Gráfica Tiprogresso), e site legislacao.presidencia.gov.br .

Conteúdo digital: Leonardo Coutinho

Edição: Salomão de Castro

 

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