Coordenadoria de Comunicação Social

Lúcia Stedile: um olhar sobre a cobertura jornalística da Constituinte estadual, 30 anos depois

Por ALECE
09/10/2019 12:55

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Lúcia Stedile narra de forma entusiasmada como foi a cobertura jornalística do momento histórico Lúcia Stedile narra de forma entusiasmada como foi a cobertura jornalística do momento histórico - Foto: Máximo Moura

Ainda com poucos anos de exercício da profissão, a jornalista Lúcia Stedile integrou a equipe da Assessoria de Imprensa da Assembleia Legislativa do Ceará durante a Assembleia Estadual Constituinte de 1989. Graduada em Jornalismo (à época, curso de Comunicação Social) pela Universidade Federal do Ceará (UFC) em 1983, a profissional se sentiu envolvida pelo clima de redemocratização do Brasil, e, apesar da jornada de trabalho estafante, confessa que foram vividos momentos de entusiasmo com os novos ares políticos, devido ao fim do regime de exceção que o país atravessou.

Hoje editora do jornal AL Notícias, veículo de comunicação da Casa, ela recorda que o grupo de trabalho responsável por fazer a cobertura da Constituinte e divulgar os acontecimentos com os veículos de comunicação era bem reduzida. "Além de mim, também fazia parte a jornalista Clara Guimarães, o nosso chefe, jornalista Messias Pontes (falecido em 2013), e o servidor Hélder Leitão, responsável pela digitação de todo o material produzido e a redigitação, após a revisão", recorda.

Sem as facilidades dos avanços tecnológicos, Lúcia lembra que o material produzido pela equipe reduzida tinha de ser datilografado em máquinas manuais, utilizando papel carbono. "Como não havia Internet, todo o material, depois de finalizado, era distribuído para os veículos de comunicação (rádios, jornais e emissoras de televisão), em boletins. Diariamente, a equipe produzia em torno de sete matérias abordando desde pronunciamentos de deputados em plenário, processo de apreciação de emendas e proposições nas comissões técnicas e votações em plenário", elenca.

Por volta da meia noite

Como só havia duas jornalistas para a cobertura, a divisão de trabalho era bem simples. Segundo Lúcia, Clara ficava responsável pelo primeiro turno, e ela continuava a partir daí. Como as sessões tinham início às 18 horas e se estendiam normalmente até a meia noite, cabia a ela o período a partir das 21 horas, indo até o final dos trabalhos. "Mas esses horários não eram precisos. Se a Clara estivesse acompanhando uma discussão em uma comissão, por exemplo, ela continuava com a tarefa até a conclusão dessa etapa. Da mesma forma, muitas vezes as discussão se estendia depois da meia noite, madrugada adentro, e eu ficava acompanhando até o final", pontua.

Só após acompanhar todos os acontecimentos que deveriam ser incluídos no boletim diário, as matérias eram redigidas, quase sempre de madrugada. Por conta do adiantado da hora, e pela ausência de transporte coletivo nesse horário, a Assembleia destinava um transporte que fazia rota deixando os servidores em suas casas. "Nós chamávamos de bonde da madrugada, com o pessoal de diversos setores, principalmente do Departamento Legislativo, que assim como nós éramos os últimos a deixar o ambiente de trabalho", frisa.

Tripla jornada

Lúcia Stédile, além de se dedicar à Assembleia Estadual Constituinte também trabalhava no expediente da manhã, a partir das 9 horas, na Câmara Municipal de Fortaleza, e no extinto jornal Tribuna do Ceará, cobrindo as atividades do Legislativo estadual, a partir das 14 horas. "Era bem puxado, e, por conta do regime de trabalho, entendia perfeitamente porque muitos jornalistas morrem do coração", avalia. Mas, para ela, havia diferenças entre o "batente" do periódico e os critérios da assessoria de imprensa.

"Enquanto no jornal tínhamos possibilidade de escrever de uma forma mais especulativa sobre conversas de bastidores e informações passadas por fontes, até mesmo do Palácio do Governo, na Constituinte, a nossa tarefa era ser o mais fiel aos fatos possíveis, e o que fosse de real interesse da sociedade, sem se dedicar às pequenas questões que não seriam objeto da nova Carta Magna do Estado", diferencia.

Lúcia Stedile lembra que foram apresentadas emendas sobre temas como criação de uma escola em determinado município ou a transformação da base aérea em parque público estadual. Como não cabia o teor dessas matérias no texto constitucional, por se tratar de matérias de projetos de lei infraconstitucionais ou mesmo que poderiam ferir a Constituição Federal, não havia porque noticiar esses proposições.

O clima que reinava na Assembleia, segundo a jornalista, era de total euforia, o que motivava muito a enfrentar a rotina de trabalho, que a depender do dia, podia ir até às 3 horas. "A gente estava saindo de um período de solavancos na política nacional, saindo de um regime militar pesado, após a campanha pelas eleições presidenciais diretas, o trauma nacional terrível da morte do presidente Tancredo Neves, eleito pelo Congresso Nacional em 1985. A gente tinha uma enorme esperança de um recomeço", recorda.

Para Lúcia, a Constituição Federal, promulgada em 1988, já surgiu como um "sopro de mudança", que ainda não havia acontecido por conta da morte de Tancredo Neves. "Quando chegou a Constituinte Estadual, esse clima de renovação ainda persistia, de brisa fresca da democracia soprando sob o país, o que também teve impacto no exercício profissional dos jornalistas, já que a censura institucionalizada deixou de existir", contextualiza.

Correlação de forças em plenário

Na avaliação da jornalista, a bancada de esquerda teve uma representação atuante durante a legislatura que aconteceu simultânea à Constituinte. Ela se refere ao grupo formado pelos então deputados João Alfredo (PT), Ilário Marques (PT), Paulo Quezado (PDT), Edson Silva (PDT) e Eudoro Santana (eleito pelo PMDB e posteriormente filiado ao PSB). "Eram deputados que, pela oposição, tiveram atuações marcantes", define.

Também é considerado por ela um mérito que a Assembleia Estadual Constituinte tenha sido presidida pelo deputado Antônio Câmara (à época do PMDB), integrante do bloco da oposição ao então governador Tasso Jereissati (também filiado ao PMDB e hoje senador pelo PSDB).

"Foi um raro momento em que se viu um poder ser chefiado por um deputado que não era do bloco do Governo do Estado. Isso dava uma dinâmica maravilhosa às sessões. A aprovação de matérias era disputadíssima, voto a voto. Havia um grande empenho de parte a parte em todas as votações, bem diferente de quando o bloco governista é muito superior em número à bancada oposicionista, onde os resultados de votações são bem previsíveis", afirma a jornalista sobre o período vivenciado há 30 anos. Que, para quem conversa com ela, não tem dúvidas das marcas deixadas pelo momento histórico na trajetória da jornalista.

 

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