Leonardo Borba: a visão de um aprendiz permanente sobre a Constituinte de 1989
Por ALECE08/10/2019 11:05
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Aprendendo enquanto faz. Era assim que o servidor Leonardo Borba, recém-nomeado para dirigir o Departamento Legislativo da Assembleia Legislativa do Ceará, em 1988, se sentiu poucos momentos antes de serem iniciados os trabalhos da Assembleia Estadual Constituinte. "Eu havia me preparado para assumir somente o trabalho regular do Poder Legislativo, não tinha ainda avaliado nem quantificado o quanto a elaboração da Carta Magna do Estado iria exigir de todos, funcionários e deputados. Eu sabia que iria acumular as duas funções, mas não esperava tanto", recorda.
Conforme revelou, na época, com o volume de trabalho foi possível conquistar um aprendizado imediato ao longo de todo o processo de composição da Constituição Estadual. Até então, Leonardo era servidor vinculado à 1ª Secretaria da Mesa Diretora Assembleia. "Eu entrei para substituir o José Ferreira da Silva (conhecido entre os seus pares como Ferreirinha), não fui pupilo dele, como muita gente até hoje pensa. Jamais esperei a grande extensão que seria este trabalho em um momento histórico para o Ceará e para o Brasil, com a restauração do Sistema Democrático de Direito", frisa.
De acordo com Leonardo Borba, primeiramente, no início de 1989, foi formada a Comissão de Sondagem e Proposições, que colhia a emendas para a feitura da Carta. No início, conforme salienta, houve a discussão, pelos deputados constituintes, relativa à forma de trabalho que seria adotada. As opções eram aproveitar o texto constitucional aprovado pela Assembleia Nacional Constituinte e promulgada pelo então presidente Ulysses Guimarães (então do PMDB-SP), fazendo as alterações necessárias ou partir do zero, com todos os deputados estaduais constituintes apresentando sugestões, e também colhendo iniciativas da sociedade civil. A segunda opção foi vitoriosa, o que por si só significou um maior volume de trabalho.
"As pessoas hoje talvez não tenham noção de como era feito o trabalho na época, sem os benefícios de uma tecnologia digital. Não se usava computador, todo o material era impresso. Tivemos até de improvisar armários sob as escadas da Assembleia, com estruturas invioláveis, para o arquivamento de todos os documentos impressos. Era muita coisa. E o mais grave é que se uma página era retirada da ordem em que foi inserida, era muito trabalho perdido, demandando a repetição de todo o esforço já realizado", reconstitui o servidor.
O desafio de botar tudo no papel
Leonardo avalia que a Constituinte estadual deve ter consumido facilmente mais de dez mil resmas de papel, haja vista que toda nova emenda tinha que ser reproduzida para a distribuição com todos os 46 deputados e diversos setores, como a assessoria jurídica (que originou a atual Procuradoria Jurídica da Assembleia), comissões técnicas e entidades interessadas no processo de tramitação. "Devido a sobrecarga dos trabalhos do serviço de fotocópia, os avulsos eram rodados em mimeógrafo a álcool", lembra.
Com todas as exigências da Assembleia Constituinte, ele recorda que permaneciam as rotinas diárias próprias do Poder Legislativo. Enquanto as proposições eram sistematizadas em suas comissões próprias, as atividades da Casa continuavam regulares. Porém, quando iniciou-se o processo de votação da Constituição em plenário, não houve como continuar no mesmo ritmo. "A Assembleia ordinária passou a realizar sessões somente em regime de esforço concentrado, quando havia matérias de interesse do Governo do Estado, ou alguma matéria mais urgente, dedicando todo o tempo para a elaboração da Carta", explica.
Com o início da votação da nova Constituição, a partir de abril de 1989, a rotina foi completamente alterada, segundo Leonardo de Borba. "Não tínhamos mais horário", sustenta. Ele conta que as atividades semanais iniciavam cedo da manhã de segunda-feira, sem se ter uma ideia de a que horas seria o almoço, ou quando ia terminar o expediente. "A rotina da Assembleia regular às vezes era até esquecida porque a dedicação voltava-se toda para a Constituinte, com exceção dos esforços concentrados para atendimento de casos pontuais, o mais rápido permitido pelo processo legislativo", justifica.
Alta produtividade
O então diretor do Departamento Legislativo lembra que não raras vezes pediu aos céus que não houvesse quorum para a realização de sessões, que foram transferidas para o expediente da manhã, o que o permitiria poder dedicar-se totalmente à Constituição, que tinha sessões com início às 14 horas, seguindo noite adentro, até que se esgotasse a pauta de votação do dia. Leonardo lembra que algumas discussões sobre pontos polêmicos se estendiam por horas. "Às vezes, nós funcionários até esquecíamos das sessões ordinárias, pelo tamanho da demanda da Constituinte", afirma.
O normal, de acordo com Leonardo, era a sessão da Constituinte ser encerrada por volta de 22 ou 23 horas, todos os dias. Terminado o plenário, os servidores do Departamento Legislativo tinham de organizar a redação de tudo que havia sido aprovado e preparar a pauta do dia seguinte. Essa complementação das atividades seguia pela madrugada. "Quando a gente ia para casa à 1 (uma) hora da madrugada, é porque estávamos saindo cedo, para se ter uma ideia do que era a nossa rotina", recorda o veterano do Poder Legislativo.
"Era uma operação de guerra mesmo conseguir dar conta de tudo. Nisso, o serviço de fotocópia teve um papel fundamental para o bom andamento dos trabalhos, lembrando que se alguém chegasse a tirar algum papel do lugar, tinha que se repetir operações de uma ou duas horas. Não tínhamos sequer computador. Eram as antigas máquinas manuais que usávamos para dar conta de todos os textos. O único computador que existia na Casa era um Itautec, com tela verde e sistema DOS - SRI, que só um servidor da Informática sabia mexer. Era uma coisa bem rudimentar, aos olhos da contemporaneidade, mas era o que tínhamos na época", afirma Leonardo, em referência às mudanças tecnológicas 30 anos depois.
Como funcionava o Departamento Legislativo
Para organizar todo o material produzido, havia à disposição do Departamento Legislativo um arquivo, onde eram depositadas todas as emendas, que logo ficou lotado. "Depois disso, todo canto da Assembleia passou a ser também usado como arquivo. A gente fechava as partes inferiores das escadas para guardar as emendas. Tudo isso com um número reduzido de pessoas, já que o departamento contava com menos gente do que tem hoje e sem as facilidades tecnológicas de hoje", afirma.
Ele observa que talvez o número reduzido de pessoal possa ter até ajudado porque "mais mãos lidando com o mesmo material poderia dificultar a organização de tudo". Como se não bastassem as dificuldades próprias da rotina, Leonardo lembra que em determinado momento, o ar condicionado quebrou, e foram colocados ventiladores no plenário, além de desobrigar os deputados do uso do paletó. "Foram uns 15 a 20 dias, desse jeito", quantifica, ao falar sobre as concessões a ritos dificilmente quebrados no parlamento.
Quando houve a eleição da direção da Assembleia Constituinte, em outubro de 1988, Leonardo Borba ainda não havia assumido o Departamento Legislativo. Ele recorda que o fato da escolha da direção antes da instalação da Constituinte, em fevereiro de 1989, era um fato inédito. "Houve uma disputa entre Júlio Rêgo e Antonio Câmara, que concorriam eleitoralmente na Região dos Inhamuns, principalmente no município de Tauá, em outubro, mas era de domínio público que se o então deputado Ciro Gomes não fosse eleito prefeito de Fortaleza, ele seria praticamente aclamado para a função", frisa.
Pautas polêmicas
Leonardo Borba recorda ainda que por conta das discussões ocorridas nas comissões, já se podia antecipar os pontos que iriam gerar polêmicas. Entre estes, ele aponta tudo propostas relacionadas ao meio ambiente e participação da sociedade nos colegiados de representação do Governo. "Em muitos momentos, a gente percebia um equilíbrio de forças nas votações, que tornava imprevisíveis os resultados, mesmo o governo tendo uma bancada bem maior que a oposição. O Centrão (bloco de parlamentares mais conservadores) ajudava muito o Governo, mas havia dissensões com alguma frequência. A oposição tinha 11 deputados e como venceu algumas votações, pelo menos 13 deputados de situação, com um certo rodízio, votavam contra o seu próprio bloco. Mas houve rachas também na oposição. Teve casos de um deputado do PT votar de um jeito e o outro deputado votar de outro", recorda Leonardo, em referência à bancada partidária então constituída por apenas dois parlamentares: João Alfredo e Ilário Marques.
Trinta anos após a promulgação da Constituição do Estado, Leonardo Borba avalia como de grande importância a experiência da qual participou. "Sem qualquer dúvida, a gente pode afirmar que a população do Ceará, a partir daí obteve grandes avanços sociais, muitos destes adaptando as propostas aprovadas pela Constituição Federal. Nós não tínhamos quase nada, e hoje direitos são reconhecidos além da área social, também no meio ambiente e relações de trabalho", afirma Leonardo, que atualmente atua no gabinete da deputada Patrícia Aguiar (PSD). Ele chegou a atuar no plano nacional, ao estar a serviço do mandato da então senadora Patrícia Saboya (à época do PPS), de 2003 a 2010.
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